"podemos dizer que hoje, em nossa experiência como humanos, o passado não conta muito, pois não oferece fundamentos seguros para uma perspectiva de vida".
Zygmunt Bauman (1925- )
O esquecimento, a negação do passado e o
silêncio são características do tempo presente, e sendo assim tornam-se produtora
de cultura. É preciso que parta do pressuposto que a “memória não se reduz ao
ato de recordar” (DELGADO, 2003, p. 17), e sendo assim se dá, essencialmente,
na relação com o esquecimento e a negação do passado. Logo, analisar o
esquecimento e o abandono do passado se torna fundamental no processo de
reconstrução da memória. Então, se para Ricoeur (2007), “lembrar-se é, em
grande parte, não esquecer” (p. 451), o inverso também se mostra funcional, ou
seja, esquecer é, em grande parte, não se lembrar e, nesse caso, daquilo de que
não se quer lembrar.
Segundo Ricoeur (2007) “o passado vivenciado
é indestrutível” (p. 453), ou seja, permanece enquanto registro mnêmico, ainda
que de forma inconsciente. Lombardi (2011) confirma tal ideia e acrescenta: “ao
mesmo tempo em que a cultura é feita de memória, esta contraditoriamente também
implica no esquecimento” (p. 77). Para o autor, a memória é “a possibilidade e
capacidade de dispor dos conhecimentos passados” (Idem, p. 86). Sendo assim, o esquecimento e a memória são
mecanismos capazes de conservar, reviver e restabelecer as atuais trajetórias
histórico-sociais, pressupostos partilhados originariamente nos escritos de
Ricoeur (2007), segundo os quais o esquecimento está intimamente relacionado à memória.
Na perspectiva de Jameson (2000) há uma crise
de historicidade que é capaz de desvelar um diagnóstico cultural de
esquizofrenia social. Para tanto, o autor afirma que “somos incapazes de
unificar o passado, o presente e o futuro de nossa própria experiência
biográfica” (p. 53). Para esse autor, o resultado estético dessa ruptura de
temporalidade é o isolamento, é o fortalecimento do presente, numa espécie de
materialidade das percepções e a perda da realidade, sendo que tudo se dá numa
intensidade “alucinógena ou intoxicante” (Idem,
p. 54).
Segundo Bauman (2011), a sociedade atual só
consegue viver uma parte da história e “não se deixa integrar facilmente numa
totalidade” (p. 97). Essa sensação de desapego ao passado e de virtualidade do
futuro aponta para uma realidade do mundo do capitalismo emergido da lógica do
consumismo, onde o imediatismo, a flexibilidade e a satisfação momentânea são
discursos assimilados com naturalidade. Sendo assim, Bauman (2008) afirma que
as âncoras estão flutuando.
Assim e simplesmente,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
[escrito em 15
de Maio de 2016]
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. História oral e narrativa: tempo, memória e identidades. Revista
História Oral - Associação Brasileira
de História Oral, n. 6, pp. 9-25, jul. 2003.
RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2007.
JAMESON, Frederick. Pós-modernismo: a lógica cultural do capitalismo tardio. São Paulo: Ática, 2000.
BAUMAN, Zygmunt. A sociedade individualizada: vidas contadas e histórias vividas. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
BAUMAN, Zygmunt. Vida em fragmentos: sobre ética pós-moderna. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.
LOMBARDI, José Claudinei [org]. História, memória e educação. Campinas: Alínea, 2011.
RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2007.
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BAUMAN, Zygmunt. Vida em fragmentos: sobre ética pós-moderna. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.
LOMBARDI, José Claudinei [org]. História, memória e educação. Campinas: Alínea, 2011.