quarta-feira, 17 de junho de 2015

O que nos falta é criatividade


“O maior inimigo da criatividade é o bom senso...”.
Pablo Picasso (1881-1973) 

O rumo para o qual estamos indo é sabido. Todos estão indo pra lá. Uma odisseia sem muita diversidade, sem muita identidade, sem muita intencionalidade e sem muita criatividade. Estamos indo, seguindo a maré. Sendo governados pela sonoridade da mídia que teatraliza e uniformiza a todos, nos tornando reféns de nossas próprias histórias. Há até uns discursos destoantes, mas, às vezes, parece que até isto é intencionalmente previsível. Tentam, convictamente, mostrar que o diferente é disforme, esquizofrênico, maléfico, alucinógeno, e coisas do gênero. Querem que acreditemos que ser distinto é uma esquisitice intolerável frente aos fracassados padrões desta sociedade do sucesso visível.

O principal sustentáculo de toda esta carência criativa é a culpabilidade, do outro, claro. Há de se culpar alguma coisa, alguém, algum passado, e quem sabe até o preconizar a culpa do futuro. Culpam a falta de recursos financeiros, e assim, se sujeitam a não conseguirem chegar para além da medíocre linha do sucesso empresarial. Culpam o governo pelas faltas sociais, e assim, encantam a si mesmos com enfadonhos discursos sobre a intangibilidade humanitária. Culpam os opressores do passado, e assim, encontram a grande desculpa para se acomodar no deleite do fracasso justificável. Culpam algumas pessoas por qualquer coisa, e assim, se escondem no revigorante vale das deliciosas acusações.

É preciso ir além. Até na arte de culpar é preciso que haja mais criatividade, pois estes discursos já caducaram. Não convencem mais. Apesar de ainda serem muito funcionais entre os romeiros da igualdade – por isto, repetir o que já foi dito é confortante, cumprimentar o outro com um pergunta que nunca tem resposta é amigável, descrever o óbvio com eloquência é admirável e escrever muito sobre o que todos sabem é enriquecedor. É preciso reinventar o que estamos fazendo! É preciso dizer verdades com um pouco mais de mentiras e, quem sabe, conseguir mentir com um pouco mais de verdade (verdades aqui representam nossas convicções mais concretas, e mentiras aqui representam nossas convictas incertezas, que geralmente as ridicularizamos).

A criatividade permite gangorrear, perder, arriscar, não saber, contemplar, chorar, enlutar, indagar, silenciar, desdomesticar, desadestrar, desmecanizar, despir... enfim, as pessoas criativas sabem que tristeza não significa estar triste, nem alegria significa estar alegre. Sabem que estar vivo não significa estar respirando, nem morrer significa estar enterrado. Pessoas criativas rompem o cativeiro das categorias. Rompem o estereótipo. Superam os estigmas. Por isto, precisamos de mais criatividade. Precisamos de cantores mais desafinados, de escritores mais analfabetos, de artistas mais despreparados, de professores com mais dúvidas, de carteiros sem endereços, de dançarinos sem música, de palhaços sem maquiagens, de repórteres sem notícias. Precisamos de pessoas desrotularizadas. Para que haja criatividade precisamos de liberdade. Liberdade de fazer feio, de não ser aceito, de contradizer. Liberdade de criar...

Assim e simplesmente,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
[escrito em 16 de Junho de 2015]

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