“Ninguém
educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si,
mediatizados pelo mundo”.
Paulo Freire (1921-1997)
Em tempos mais do que modernos, onde tudo se inverte, se confunde,
se complementa, se contrapõe, se mistura, se desfigura e se reconfigura, no
âmbito universitário tal processo fica notório numa mutação funcional do papel
das coordenações de curso/acadêmica. Ao que parece, a sala de coordenação se
tornou numa clínica psicológica onde o aluno se tornou o paciente que se vale
desta mutação para desabafar, manipular e ameaçar os agentes educacionais. É
imprescindível, então, que se diagnostique este perfil de aluno/paciente para
não cair nas artimanhas desta confusão urbana/capitalista, tendo condições de diferenciar
o estado de aluno e o estado de paciente – e assim ser possível traçar um
caminho de diálogo coerente com a figura que se apresenta na sala de
coordenação. A seguir será descrito alguns tipos clássicos de aluno/paciente
que perambula pelas faculdades/universidades do Brasil e que são seduzidos pela
superioridade da educação.
O primeiro tipo de aluno/paciente é aquele que confunde a
coordenação com terapia. Estes pensam, afetivamente, que a coordenação existe,
primariamente e essencialmente, para escutá-los, e este escutar inclui todo
tipo de desabafo, quer seja referente ao contexto acadêmico ou pessoal (sendo
que ambos se entrelaçam no cotidiano). Este tipo de aluno/paciente sempre
começa a conversa elogiando algo no coordenador (a) – o elogio funciona tipo um
quebra-gelo para a conversa ser aceita pelo psicólogo/coordenador. Após ganhar
atenção e a cordialidade do atarefado coordenador tudo fica mais fácil, ai
assuntos como moda, culinária, estética, automobilismo, filosofia, religião,
política, e toda sorte de temáticas são toleráveis. Neste estágio de inércia
cognitiva começa a etapa terapêutica de fato. Aqui a idéia é desabafar,
des-sufocar da vida louca, conversar despretensiosamente, distrair a cabeça,
enfim, fazer uma terapia existencial.
O segundo tipo de aluno/paciente é aquele que confunde a
coordenação com políticas de guerra territoriais. Estes pensam que precisam de
aliados na guerra escolar e, então,
nada mais sensato que aglutinar com o psicólogo/coordenador (o elo mais forte
da corrente universitária, perdendo
apenas para a direção). Este tipo de aluno/paciente, quase sempre, se trejeita
inicialmente do primeiro tipo (coordenação como terapia) por uma razão lógica,
ninguém se alia a uma causa, mas sim a uma pessoa. Portanto, o processo de
formação de milícia escolar se dá
pela afetividade e espontaneidade. A idéia aqui é manipular a coordenação para
que quando necessário (e vai ser necessário!) ter o coordenador/psicólogo como
aliado, desbancando toda e qualquer ameaça, inclusive (e preferencialmente) o
professor, enfim, faz uma cadeia de comunicação intencional de guerrilha com
vestimentas psicológicas.
O terceiro tipo de aluno/paciente é aquele que confunde a
coordenação com psico-capitalismo (um neologismo necessário para destacar a
opressão capitalista que transforma
alunos em clientes, valendo de um discurso articuladamente psicológico). Estes
pensam que por estarem pagando detêm o controle de todas as instâncias
acadêmicas (tristemente, há relatos que confirmam tal genocídio educacional). Este
tipo de aluno/paciente desenvolveu uma técnica psicológica fundamentada na
lógica capitalista que pende o poder de persuasão para o pagador da força de
trabalho. Este nível de patologia
pedagógica é frequentemente perceptível quando o aluno/paciente não consegue
ser cordial e simpático (primeiro tipo), nem consegue puxar e manipular o
psicólogo/coordenador para ser aliado (segundo tipo). A ideia aqui é ameaçar!
Inicialmente tenta-se subjugar o professor, sob o argumento que o aluno que
paga o salário do docente. Não funcionando esta tática terrorista vai-se para o
próximo nível, render a coordenação, sob o argumento de abandonar a faculdade. Enfim,
faz do ensino superior uma zona monetária de Wall Street.
Ao ler este artigo, o leitor pode ter pensando que a proposta fora
desmoralizar os alunos. Não! Esta nunca foi à intenção. Até porque o aluno não
é a causa, apenas a consequência de tudo que pontuamos anteriormente. O aluno é
apenas a ponta de um iceberg gigantesco
chamado educação brasileira; é apenas fruto de uma sociedade líquida (como propõem Zygmunt Bauman). Portanto, é válido
ratificar que todo o esquema educacional
tupiniquim precisa ser revisto. O aluno/paciente é somente uma forma mutante de
ser estudante, onde o que menos importa é o processo ensino-aprendizagem; o
psicólogo/coordenador é tão-somente uma marionete organizacional fragilizada
pelo poder; o professor é tão-só um objeto de uso-fruto do conceito de Mais
Valia Relativa proposta por Karl Max; e, a faculdade/universidade é unicamente
um coliseu contemporâneo.
Assim e simplesmente,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
[escrito em 29 de Março de 2014]
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