"...Para não ser o escravo mártir do tempo, embriague-se; embriague-se sem parar! De vinho, de poesia ou de virtude, como quiser".
Charles
Baudelaire (1821-1867)
A historicidade da linguagem
poética[1]
no contexto brasileiro apresenta várias facetas e implicações sociais. Por ser
abrangente tanto em autores, quanto em movimentos literários, será destacado
neste primeiro capítulo apenas um poeta de cada período poético brasileiro dos
séculos XX e XXI. Priorizando os fatos sociológicos e antropológicos que
orbitam sob a pena dos escritores tupiniquins[2].
Sendo, portanto, necessário analisar a vida e a obra dos poetas com a
cosmovisão peculiar de suas próprias épocas. Entendendo que cada estrofe
poética agrega em si a intencionalidade, a provocação e a integralidade social.
Ser poeta não é apenas escrever sobre as nuances da vida de forma estilizada,
mas consiste em sensibilizar-se com o viver humano.
A história recente da
linguagem poética brasileira se inicia com o período denominado
“pré-modernismo”, também conhecido como estética
impressionista, podendo ser datado entre 1910 e 1920. Os principais poetas
desta época são: Olavo Bilac, Da Costa e Silva, Pedro Kilkerry, Raul de Leoni,
Machado de Assis, entre outros. Deste período destacaremos o poeta, escritor,
jornalista e contista Machado de Assis. Ele nasceu em 21 de junho de 1839, no
Rio de Janeiro, faleceu em 29 de setembro de 1908 – ou seja, 69 anos de idade.
Entre suas principais obras se destacam: “Memórias Póstumas de Brás Cubas” e
“Dom Casmurro”. Escreveu muito sobre o realismo da vida, sobre suas desventuras
pessimistas, apesar do notório romantismo nos textos machadianos.
A percepção sociolinguística[3]
nos escritos de Machado de Assis é perceptível, para tanto é válido destacar
que: “O autor realista procura retratar a verdade observável no presente,
evitando aquilo foi gosto típico do romantismo brasileiro (...) este estilo é
capaz de reproduzir o verdadeiro relevo das coisas e sublinhar com maior firmeza
a ação dos caracteres (...) Machado de
Assis ...achou no teatro de Shakespeare, principalmente, dramas humanos que ele
achou deveriam aparecer em romances (...) o romance, para conter realismo
convincente precisa dos conflitos humanos e de muita caracterização de personagens”
(BAGBY JUNIOR, 1933, p. 20,27).
No período denominado “modernismo”, conhecido também como movimento modernista – tendo como data
provável a primeira metade do século XX. Os principais poetas desta época são:
Carlos Drummond de Andrade, Augusto Meyer, Cecília Meireles, Manuel Bandeira,
Mário de Andrade, Mário Quintana, Vinicius de Moraes, entre outros.
Destacaremos o poeta, cronista e contista Carlos Drummond de Andrade. Ele
nasceu em 31 de outubro de 1902, em Itabira – Minas Gerais, veio a falecer em
17 de agosto de 1987 com 85 anos de idade. Dentre suas obras poéticas é
merecedor de destaque: “Brejo das Almas”, “Sentimento do Mundo”, “Lição de
Coisas”, “Viola de Bolso”, “A Vida Passada a Limpo” e “Novos Poemas”. Drummond
promoveu a liberdade poética, extrapolando os padrões rígidos da época,
usando-se da poesia como forma libertadora.
No que tange a relação sociolinguística drummondiana valeremos dos
escritos de LIMA, que afirma: “Drummond concentra-se nas impressões que lhe causa
o amor entre as coisas do mundo – ‘amor cachorro bandido trem’ – (...) o eu
nostalgicamente contempla um amor situado entre as estrelas, cuja representação
lhe parece agora impossível. Embora nos anos cinquenta a situação inverta-se, a
tensão entre analogia e ironia não desaparece. O poeta concentra-se na visão do
amor fora do tempo, mas o confronta à existência” (LIMA, 1995, p.17).
Num período relativamente mais próximo ao presente temos o então chamado
“geração de 45”, um grupo que ganhou evidência no modernismo brasileiro. Desta
época podem-se destacar os poetas: Carlos Pena Filho, Fernando Ferreira de
Loanda, Geraldo Pinto Rodrigues, Lêdo Ivo, Paulo Bonfim, Péricles Eugênio da
Silva Ramos. Concentraremos nossa analise em Carlos Pena Filho. Ele nasceu em
19 de maio de 1929, na cidade de Recife, veio falecer no dia 10 de junho de
1960 com apenas 31 anos de idade. Ele é considerado um dos maiores
poetas/escritores pernambucanos na segunda metade do século XX. Sua obra é
composta pelos títulos: “o tempo da busca”, “memórias do Boi Serapião”, “a
vertigem Lúcida” e “livro geral”. Pena foi um poeta política e teve sua
histórica emaranhada na vida pública de Pernambuco.
O estilo de Pena por si só já faz paralelo congênere com a
sociolinguística, porém com fins a endossar a luta poética dos pernambucanos
citaremos parte da obra organizada por CAMPOS e CORDEIRO, que reforçam:
“Pernambuco, com suas revoluções falhadas, com seus movimentos libertários
abafados a ferro e a fogo, é uma espécie de D. Quixote da Federação (...) aqui,
em nossas terras, o poeta cristão-novo Bento Teixeira fez o primeiro poema do
Brasil, Prosopopéia. Daqui saíram as
primeiras imagens do Mundo Novo. Aqui, forjou-se o berço da nacionalidade.
Pernambuco não se cansa de sonhar, de criar, de fazer poesia” (CAMPOS e
CORDEIRO, 2005, p. 35,36).
Após a famosa “geração de 45” chegamos ao que parece ser sua imediata
consequência, denominada pelas nomenclaturas “concretismo, neoconcretismo,
práxis e poema-processo”. Os poetas destaques desta época são: Álvaro de Sá,
Dailor Varela, Dércio Pignatari, Haroldo de Campos, Mário Chamie, entre outros.
Daremos destaque ao poeta e crítico brasileiro Mário Chamie. Ele nasceu em 1°
de abril de 1933, em Cajobi, faleceu em 3 de julho de 2011 – com 78 anos de idade.
Sua obra é vasta, ganhando grande destaque com: “intertexto”, instauração
práxis” e “palavra inscrita”. Ele abandonou o concretismo e fundou o movimento
da poesia-práxis.
Neste período poético defendia-se a racionalidade e rejeitava-se toda
forma de expressionismo, como endossa
BOSI: “A poética do grupo práxis vincula a palavra e o contexto
extralinguístico (...) o autor práxis não escreve sobre temas. Ele parte de
áreas (seja um fato externo ou emoção), procurando conhecer todos os
significados e contradições possíveis e atuantes dessa área, através de
elementos sensíveis que conferem a elas realidade e existência (...)” (BOSI,
2006, p. 483).
Por fim, chegamos aos poetas contemporâneos, que a semelhança dos demais
tem em suas poesias temas e relevância sociolinguística. Mesmo sendo difícil
definir a identidade de um movimento literário vivendo na mesma época, é
necessário contextualizar e contemporanizar.
Portanto, neste período destacam-se os poetas: Adélia Prado, Ariano Suassuna,
Carlos Nejar, Chacal, Dora Ferreira da Silva, Ivan Junqueira, José Chagas,
Lélia Coelho Frota, Neide Archanjo, Roberto Piva, Ruy Espinheira Filho, entre
outros. Enfatizaremos o escritor, poeta e dramaturgo Ariano Suassuna. Ele
nasceu em 16 de junho de 1927, João Pessoa na Paraíba. Dentre seus escritos há
destaque para: “auto da compadecida”, “torturas de um coração”, “o romance d’a
pedra do reino e o príncipe do sangue do vai-e-volta” e “sonetos de Albano
Cervonegro”. Por ser contemporâneo, os seus escritos desnuda a fragilidade da
presente cultura brasileira e seus principais problemas sociais como pobreza,
religiosidade e politica.
Sobre Suassuna ainda há muito a se descobrir, mas temos algumas
gotículas de função poética a serem lidas e interpretadas a partir do
cotidiano. Como afirma NEWTON JUNIOR: “...a poesia de Suassuna, desde o início,
trilhou caminhos muito particulares, principalmente a partir do momento em que
o escritor procura vincular sua produção de poeta erudito, e mesmo clássico, ao
romanceiro popular nordestino. A presença, a sua poesia, do elemento popular, e
a intenção explícita de fazer uma poesia erudita tomando com ponto de partida a
produção poética do nosso romanceiro, permitem-nos falar de uma poesia
armorial...” (NEWTON JUNIOR, 1999, p. 48).
Os poetas, independente de sua época histórica, ocupam lugar de destaque
na releitura de mundo. Estes que chamamos de poetas são pessoas que embutem uma
nova perspectiva social aos seus leitores e em si mesmo; são escritores que
ousam burilar inquietudes nos
corações, especialmente em seus próprios; são gente da gente que querem usar a letra como ferramenta artesã de
visões além do óbvio. Por esta razão Vinicius de MORAES (2004, p. 14) escreveu
no poema “O Poeta” a seguinte descrição: “A vida do poeta tem um ritmo
diferente | É um contínuo de dor angustiante | O poeta é o destinado do
sofrimento | Do sofrimento que lhe clareia a visão de beleza | E a sua alma é
uma parcela do infinito distante | O infinito que ninguém sonda e ninguém
compreende. | (...) | A vida do poeta tem um ritmo diferente | Ela o conduz
errante pelos caminhos, pisando a terra e olhando o céu | Preso, eternamente
preso pelos extremos intangíveis”.
Assim e simplesmente,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
[escrito em 02 de Dezembro de 2013]
[1]
A poesia parece estar mais do lado da música e das artes plásticas e visuais do
que a literatura. (...) de fato, a poesia é um corpo estranho nas artes da
palavras. (...) Poesia é a arte do anticonsumo. A palavra “poeta” vem do grego
‘poietes = aquele que faz’. Faz o quê? Faz linguagem. (...) O poeta faz
linguagem para generalizar e regenerar sentimentos” (PIGNATARI, 2004:9,10)
[2]
No senso comum o termo tupiniquim
configura-se em uma metonímia de Brasil ou brasileiro.
[3]
O termo sociolinguística refere-se a
uma área específica da lingüística que se ocupa em relacionar a língua e a
formas culturais de sociedade. Destaca-se a maneira como a linguagem é usada e
os efeitos do uso na cosmovisão peculiar de determinada época, étnica ou subgrupo.
::Referências Bibliográficas::
BAGBY JUNIOR, Alberto Ian. Machado de Assis e seus primeiros romances. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1933.
BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. 43 ed. São Paulo: Cultrix, 2006.
CAMPOS, Antônio e CORDEIRO, Cláudia. Pernambuco, terra da poesia: um painel da poesia pernambucana dos séculos XVI ao XXI. São Paulo: Escrituras Editora, 2005.
LIMA, Mirella Márcia Longo Vieira. Confidência mineira: o amor na poesia de Carlos Drummond de Andrade. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1995.
MOARES, Vinicius de. O Poeta não tem Fim. São Paulo: Vergara & Riba Editoras, 2004.
NEWTON JÚNIOR, Carlos. O Pai, o Exílio e o Reino: A poesia armorial de Ariano Suassuna. Recife: UFPE, 1999.
PIGNATARI, Décio. O Que é Comunicação Poética. São Paulo: Ateliê, 2004.
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